Qual o caminho dos Conselhos Profissionais pós STF ?

Igor Fernando Acioly Silva Baima*

O debate sobre a personalidade jurídica e do regime de trabalho dos servidores dos conselhos profissionais  não é novo. Com o estabelecimento da Nova República através da  Constituição de 1988 e da Lei 8.112/1990 também conhecida como o estatuto dos servidores públicos, esse debate ganhou novos contornos, porque muitas das leis de criação destes feitas antes desse marco legal não foram recepcionadas pelo texto constitucional, causando grande insegurança jurídica.

Mas iremos nos ater aos fatos mais recentes. Com a vitória do então candidato Jair Bolsonaro em 2018,  o Ministério do Planejamento (hoje Economia) publicou em 14 de novembro daquele ano um documento intitulado de “Relatório de Transição de Governo 2018-2019”, com o objetivo de apresentar “15 textos sobre temas estruturantes e grandes desafios a serem enfrentados pela nova equipe de Governo quanto às principais decisões sob competência do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão”.

No item de n.05 “ESTRUTURAS REGIMENTAIS E MODELOS ORGANIZACIONAIS”, o Ministério do Planejamento sugere ao novo governo Bolsonaro a edição de  Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que  discipline a natureza paraestatal dos Conselhos Profissionais. 

“Entidades Paraestatais são pessoas jurídicas privadas que não integram a estrutura da administração direta ou indireta, mas colaboram com o Estado no desempenho de atividades de interesse público, mas não exclusivas de Estado, de natureza não lucrativa. Integram o chamado Terceiro Setor. São conhecidas também como o sistema “S”, (Senac, Sesi, Sesc e Senai). Suas contas são fiscalizadas pelo TCU e seus empregados estão sujeitos ao regime Celetista, CLT.”

Mas de onde veio a ideia de definir os Conselhos Profissionais como entidades paraestatais? 

Em 2009, o Ministério do Planejamento apresentou  um anteprojeto de Lei Orgânica. A proposta de lei orgânica foi elaborada por uma Comissão de Juristas instituída pelo Ministério do Planejamento em dezembro de 2007, formada pelos professores Almiro do Couto e Silva, Carlos Ari Sundfeld, Floriano de Azevedo Marques Neto, Paulo Eduardo Garrido Modesto, Maria Coeli Simões Pires, Sergio de Andréa e Maria Sylvia di Pietro, especialistas em Direito Administrativo.

Segundo Almiro do Couto (falecido em abril 2018) salientou à época, o que era um dado importante no projeto, no que diz respeito aos conselhos profissionais:  “O projeto tem, em relação a esses conselhos, uma posição peculiar: eles foram retirados da categoria de autarquia e colocados entre as entidades paraestatais, (grifo nosso) sob pessoas jurídicas de direito público, com poderes sancionadores e regulatórios, regrados pelo Direito Público, mas ao mesmo tempo submetidos ao Direito Privado no que tange a outros aspectos, explicou”. Esses “outros aspectos”, provavelmente estava a se referir ao regime de trabalho do servidores das entidades.

É justamente da proposta desse anteprojeto, apresentado em 2009, ainda durante o governo Lula, que o Ministério do Planejamento, na gestão de Michel Temer, apresenta como solução para a situação dos Conselhos Profissionais ao Governo Bolsonaro a definição de entidades paraestatais.

Apenas 5 meses após a posse, em 05 de julho de 2019 o Governo Bolsonaro encaminha ao Congresso Nacional o texto da Proposta de Emenda à Constituição que “Dispõe sobre a natureza jurídica dos conselhos profissionais”. A mensagem nº 276 foi publicada no Diário Oficial da União e ficou conhecida posteriormente como PEC 108/2019, o centro da proposta, ainda em tramitação na câmara, é tornar os conselhos em entidades paraestatais.

Entre as opções propostas no relatório de transição, a outra alternativa seria a definição dos Conselhos como autarquias de regime especial – assim consideradas exatamente por terem regime jurídico próprio definido nas leis específicas que as regulam – o anteprojeto de 2009 limita‐se a dar um conceito genérico (as autarquias especiais), para realçar o seu maior grau de autonomia, garantida, entre outros instrumentos, pelo mandato fixo e estabilidade dos seus dirigentes, bem como pela impossibilidade de revisão de seus atos, salvo pelo Poder Judiciário.

Esse deve ser o caminho a ser tomado pós julgamento das ADC 36, ADPF 367 e ADI 5367 que tratam sobre a natureza jurídica dos Conselhos e que estão na Pauta virtual do STF, para serem julgadas de 10 a 17 de Abril/20.  A ADPF 367 pede a concessão de medida cautelar para que a Presidência da República seja notificada para adotar providências a fim de instaurar processo legislativo destinado à criação de cargos públicos, além da notificação dos conselhos de fiscalização profissional para que acompanhem a tramitação dos projetos de lei e, também, a suspensão de concursos públicos e de contratação de pessoal por conselhos, até que sejam aprovadas e sancionadas as leis de estruturação de cargos dessas entidades, a fim de não perpetuar a situação atual de inconstitucionalidade.

Paralelo a este julgamento não podemos esquecer a PEC 108/2019, ela pode tornar todo esse esforço em vão, perderiam não só os servidores, mas também a sociedade ao não ter garantido um serviço de fiscalização sem pressões e direcionamentos.

 

Igor Fernando Acioly Silva Baima é  Presidente do Sindiscose – Sindicato dos Servidores em Conselhos e Ordens de Fiscalização Profissional do estado de Sergipe

Referências:

1 – https://sindiscose.org.br/2019/07/09/pec-108-2019-muda-natureza-juridica-dos-conselhos-profissionais-para-direito-privado/

2 – https://sindiscose.org.br/2019/07/07/bolsonaro-encaminha-texto-da-proposta-de-pec-sobre-os-conselhos-profissionais/

3 – https://esquerdaonline.com.br/2018/12/07/os-conselhos-de-fiscalizacao-profissional-no-futuro-governo-bolsonaro/

4 – http://www.planejamento.gov.br/assuntos/gestao-publica/noticias/apresentacao-do-anteprojeto-da-nova-lei-organica

5 – https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/grupos-de-trabalho/55a-legislatura/comissao-de-juristas-administracao-publica/documentos/outros-documentos/Relatriodesugestesenviadascomisso.pdf

6 – http://www.direitodoestado.com.br/leiorganica/anteprojeto.pdf

7 – https://sindiscose.org.br/wp-content/uploads/2018/11/Relatorio-Transicao-de-Governo-14nov18.pdf

8 – http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=299544