Os 30 anos de uma tarde

Texto e fotografias por Henrique Maynart

Rua Maria Rezende Machado, nº 976. Bem que poderia ser mais uma comemoração de fim de ano em qualquer casa de festas pela Coroa do Meio, Zona Sul de Aracaju. O sol de novembro temperando a caída da tarde, tira-gosto no talo, barraca de batidas a todo vapor, piscina e pula-pula pra gastar animação e joelho dos pequenos e pequenas, uma aparelhagem do DJ Rafa Aragão chacoalhadora de esqueleto. Bem que poderia mesmo, com amigo secreto e tio do pavê e tudo mais, se as trabalhadoras e trabalhadores em conselhos e ordens de fiscalização não insistissem tanto pela sua organização coletiva no correr das últimas três décadas. Comemorar é, sobretudo, palavra e desordem. 

Trinta anos não são trinta dias, um clichê imbatível. Construir uma organização sindical diversa, difusa e numericamente diminuta tem lá os seus dilemas. Da ata de fundação em 3 de novembro de 1992 – ano em que o povo brasileiro chutou Fernando Collor da Presidência da República, bom frisar – até os dias estridentes de 2022 muita água se passou por debaixo dos ponteiros. 

Fausto Vieira Rocha, então fiscal do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea), topou a tarefa de presidir as duas primeiras gestões do Sindiscose nos idos otimistas da década de 90.  “Confesso que não queria não, eu já estava muito desgastado do movimento estudantil, mas a gente viu que realmente havia a necessidade e fomos pra batalha. Também ajudamos a organizar a Fenasera – Federação que organiza a categoria em escala nacional – no mesmo ano, e de lá pra cá as disputas sempre foram sempre muito difíceis”, dividiu com seus colegas enquanto recebia a homenagem da gestão da décima Diretoria Executiva do Sindiscose. 

Agradecer e dialogar nunca é demais. Em uma rápida saudação da Diretoria, o presidente Igor Baima pautou a organização da categoria na luta pela efetivação dos concursos e contra a terceirização, Antônio Oliveira – do alto de seus 35 anos de trabalho na OAB-SE – ressalta o papel dos homens negros e resistentes como ele no cotidiano da luta sindical, Juliana Oliveira pautou a luta contra o assédio e demais violências de gênero, assim com Jeane Oliveira. Tomé Filho fez questão de ressaltar “se não for pra defender a categoria eu não assumo o sindicato, não adianta”. 

Dentre as convidadas da festa, a recém-eleita deputada estadual Linda Brasil saudou a categoria e ressaltou o papel da servidora do Conselho Regional de Psicologia (CRP) Lidiane Drapala, em sua trajetória. “A Lili foi muito importante na primeira Semana de Visibilidade Trans, uma parceira de primeira hora, estou muito feliz de reencontrá-la aqui junto com todes vocês contem sempre com a gente”.

A professora Sônia Meire, que assume uma cadeira na Câmara Municipal de Aracaju a partir de 2023, também foi chamada para os dois dedos de prosa regimentais. Saudando juntamente o já homenageado Fausto, seu colega de Graduação em Pedagogia e no Magistério em geral, ela saudou a iniciativa coletiva e militante da organização sindical. “Acabamos de passar por um governo que estava disposto a nos destruir literalmente. Resistimos, derrotamos ele nas urnas e estamos derrotando eles nas ruas. As organizações sindicais são trincheiras importantes para os direitos e condições de trabalho, um suporte importante para todas e todos nestes tempos difíceis que ainda vivemos”, ressaltou. 

Logo após a falação regimental, foi a hora do parabéns, com direito a “derrama senhor” e outras coisas. O bolo de chocolate com castanhas e doce de leite adoçou a boca dos pequenos e rebateu a demanda média de glicose dos mais velhos. A tarde seguiu com muita suingueira de Edson Joy e os clássicos do axé, forró das antigas e toadas marcantes dos anos 1990 e 2000. Importante ressaltar o clímax com “Tá na hora do Jair”, clássico recente de Juliano Madeirada e Thiago Doidão que embalou a vitória de Luis Inácio Lula da Silva no segundo turno das eleições presidenciais. O hit chegou ao topo da plataforma Spotify em 27 de outubro para nunca mais ir embora. 

Na canção “Como nossos pais”, Belchior afirma que “qualquer canto é maior do que a vida de qualquer pessoa”. Quanto de vida, história e memória de trabalhadoras e trabalhadores organizados há de caber numa tarde de sol, churrasco e 50 centavos de som? Quantas décadas de luta e insistência podem caber numa tarde? Quem arriscar qualquer resposta deve perguntar diretamente a quem usou uma pulseira rosa clarinha em 12 de novembro na Rua Maria Rezende Machado, nº 976, Coroa do Meio, Zona Sul de Aracaju. 

Confira as fotos da festa: